Ele se aproxima dos distraídos

Era uma mulherzinha de cabelos compridos, roupas moderninhas e perfume de gente grande. Tinha olhos de cavalo bravo e podia pintar as unhas de azul purpurinado. Ainda éramos novinhas, e o formato das suas já era comprido. Unhas de femme fatale, que ela fazia deitada de bruços no chão do banheiro. As minhas nunca tinha sido cutiladas. Nem lixadas; elas só conheciam a tesoura. Carolina tinha a delicadeza que eu reconhecia no gesticular de minha mãe, mulher feita. Eu nem sabia a gaveta em que a babá escondia a escova de cabelos – os meus eram rentes à orelha. Eu tinha olhos grandes, de cão debruçado na mesa em hora do jantar. E fome de mundo. Ela beliscava aperitivos de feminilidade e deixava no canto do prato as criancices que me enchiam a barriga. Eu era do tipo de menina que abraça os cachorros na rua; Carolina não olhava nem para o porquinho da Índia que a mãe encomendara de fora. O cheiro de Chanel nr. 5 que denunciava sua chegada me irritava a vista, mas despertava um desejo tímido nos meninos da sala. Junto com o perfume, saía de seus poros um sex appeal que acabara de ficar mocinho. Meu apelo eram as fitas de gameboy que os garotos pediam emprestado no recreio. Ela era sonho de consumo deles; eu, goleira oficial de pelada dos times desfalcados. Soube que casou-se seis vezes. Eu fui amada. Ainda e tanto. Ela nunca me perdoou por isso.

 

love lasts

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